terça-feira, 8 de junho de 2010

Estudo de Etnocenologia sobre o trabalho do grupo teatral Novo Caminho.

culturais Afro-brasileiras Teatralidade e contemporaneidade: um estudo de caso no campo da Etnocenologia.

Sérgio Coelho Borges Farias

Bolsistas
Alexandre Geisler de Brito Lira; Eliete Teles dos Santos; Juliane do Rosário Melo; Carlos Matias de Santana.

AGOSTO DE 2007 A JULHO DE 2008

No que se refere ao projeto do orientador, pretendeu-se, através desta pesquisa, analisar e sistematizar conhecimentos relacionados à Etnocenologia no sentido de melhor compreender as manifestações espetaculares da comunidade de Itinga. Além disso, observar de que forma essas manifestações podem contribuir para o desenvolvimento de propostas metodológicas de ensino de teatro.
Os pesquisadores, contudo, após terem escolhido um grupo artístico local, com o intuito de estabelecer o dialogo com as pessoas que realizavam a cena espetacular e assegurar um intercâmbio com os mesmos, traçaram um plano de trabalho partindo das seguintes questões: como esse grupo se expressa culturalmente através do teatro? Que atividades e técnicas teatrais são utilizadas pelo grupo? Essas atividades e técnicas dialogam com os elementos culturais peculiares da comunidade? Quais são esses elementos culturais?
A partir disso, os pesquisadores elaboraram seus planos de trabalho. Juntamente com Alexandre Geisler iniciei o trabalho de campo através de observações e registros dos ensaios. No segundo momento realizamos aulas de teatro estabelecendo uma relação com as pessoas da cena. No terceiro momento registramos informações junto aos participantes através de entrevistas, captação de imagens em vídeo de ações cênicas, dando retorno posteriormente ao grupo pesquisado através de uma edição das imagens das atividades realizadas durante o processo da pesquisa.
O grupo de teatro Novo Caminho, existente na comunidade de Itinga há nove anos foi escolhido para o desenvolvimento dessa pesquisa por apresentar características que davam oportunidade à realização do estudo sobre a Etnocenologia. Pois, na classificação organizada pelo professor Armindo Bião o grupo estava na ordem das manifestações substantivas, por possuir, características de um grupo espetacular organizado tratando de tema pertinente à cultura.
A Etnocenologia é uma proposta nova de estudos cientificos dedicada á arte do espetáculo existente nas práticas e comportamentos do cotidiano do ser humano. Entretanto, não é uma ciência para se formular relatórios ou laudos sobre as manifestações populares expressas no cotidiano das pessoas, como diz Pradier: “O objetivo da etnocenologia não é formar um inventário exótico, nem de apresentar um protetor laudatório de uma prática qualquer, ela se pretende autônoma e distante de tendências etnocêntricas...” (PRADIER apud. OLIVEIRA, 2007, p. 225)
Entende-se com essa citação acima que pesquisadores da Etnocenologia preocupam-se em não se tornarem apenas estudiosos acumuladores de informações das manifestações espetaculares das comunidades e não praticarem autoritarismo sob forma de proteção aos necessitados, como ocorre muitas vezes com os que estudam o “folclore”.
Todavia os pesquisadores e artistas de teatro têm a possibilidade de, através da Etnocenologia, apreender e aprender com os artistas populares uma nova forma de fazer teatro.


2.Materiais e métodos

O primeiro momento da pesquisa consistiu em observar de que maneira eram desenvolvidas as atividades teatrais do grupo Novo Caminho. Usamos equipamentos para registros fotográficos e videográficos, para posteriormente analisar o material coletado e identificar a existência do diálogo entre as tradições culturais nordestinas (incluindo as afro-brasileiras) e matrizes culturais contemporâneas no trabalho do grupo.
No segundo momento usamos a metodologia de ensino do teatro-educação, desenvolvendo atividades como: jogos teatrais, aulas de aquecimento vocal e corporal e interpretação, objetivando uma integração com as pessoas da cena, identificar o impacto do ensino do teatro desenvolvido no final do processo deste segundo momento da pesquisa.
No terceiro momento o trabalho resultou na elaboração da edição de um audiovisual sobre a pesquisa que posteriormente será oferecido ao grupo como retorno da pesquisa-ação.


3.Resultados

O grupo Novo Caminho é um grupo de teatro composto por jovens entre 12 e 22 anos de idade que vem atuando na comunidade de Itinga, município de Lauro de Freitas, abordando temas como: escravidão; religião; a vida do povo sertanejo e preconceito racial, que refletem nas relações cotidianas dos moradores do bairro.
Nas primeiras observações dos ensaios do grupo Novo Caminho percebi uma unidade no grupo que influenciava nos resultados cênicos propostos pelos arte-educadores Eliete Teles e Rubenval - a primeira também integrante do grupo de pesquisa, o segundo estudante do curso de Licenciatura em Teatro da UFBA, ambos moradores da comunidade, que realizavam atividades com o grupo há quatro anos.
A partir do segundo momento da pesquisa, através das atividades teatrais foi interessante perceber nos integrantes do grupo Novo Caminho um corpo expressivo, uma prontidão para a realização das práticas de ensaios e mesmo num espaço físico acidentado, exaustivos jogos cênicos eram praticados com muito prazer.
A influência da matriz africana é fortemente representada na comunidade de Lauro de Freitas. Hoje com quase 80% da população composta por negros e negras, assume também ser a região com maior números de terreiros de candomblé do estado, incluindo as três principais nações: Jêje-nagô, Ketu e Angola.
Essa influência também se revela na espetacularidade do grupo Novo Caminho, um grupo composto por atores e atrizes negros, que criou um espetáculo teatral com 40 minutos de duração, refletindo sobre a temática étnico-racial, intitulada “ Qual é a cor do seu preconceito? “ .
No final das observações de alguns ensaios foram levantados questionamentos para o grupo, como: quais as cenas que eles mais gostaram de apresentar? Algumas respostas foram as seguintes: “gosto da cena do quilombo, porque temos a oportunidade de viver a história passada e aprender mais”; “a cena que fala sobre o preconceito, porque todos têm preconceito dentro de si e às vezes não percebem”; “a cena do quilombo nos mostra uma África de forma diferente, mais bonita”.
No terceiro momento foi oportuno para os pesquisadores observarem a participação do grupo Novo Caminho no Festival de Teatro realizado em Lauro de Freitas.
Conseguimos captar imagens de ações espetaculares dos atores em cena, assim como realizar entrevistas com os coordenadores, diretores teatrais e coreógrafos responsáveis pela produção artística que culminava naquele evento teatral. Vale ressaltar que através dos estudos sobre a Etnocenologia tivemos a oportunidade de compreender uma manifestação espetacular popular sem utilizar como parâmetro o teatro ocidental, mas um teatro feito pelo povo, para o povo, na busca de um melhor conhecimento da espetacularidade cotidiana do ser humano.


4.Discussão
Pretende-se demonstrar com a finalização dessa pesquisa, conhecimento relacionado à área da etnocenologia, no sentido de compreender melhor as manifestações espetaculares da cultura de uma comunidade. Ainda pretendo dar continuidade ao estudo sobre essa nova ciência para, todavia, compreendê-la melhor e assim sanar questões que ainda influenciam nas minhas investigações teóricas.
Contudo, concluo com uma questão que certamente implicará em futuros trabalhos que poderão ser desenvolvidos: Será que a etnocenologia, de maneira análoga à ciência do folclore não estaria legitimando a existência de uma dicotomia estrutural da sociedade? Por um lado, teríamos uma elite de intelectuais que se consolidaria como fonte promotora do progresso intelectual, por outro, as classes alheias que representariam as formas culturais de um passado longínquo?



5.Referências bibliográficas

ARANTES, Antonio A. O que é cultura popular. São Paulo: Brasiliense, 2. ed. 1981

BIÃO, Armindo. Artes do corpo e do espetáculo: questões de etnocenologia. Salvador: P&A editora, 2007.

DUARTE JR, João-Francisco. Por que arte-educação?. Campinas, SP: Papirus, 1991.

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. S. Paulo: DP&A, 2001.

ORTIZ, Renato. Cultura popular: organização e ideologia. Caderno de opinião, nº 12 julho de 1979.

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